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SAIR PRA ONDE?

12/dez/2023  |  Sargento Perifa

A Defesa Civil mandou a gente sair daqui, mas sair pra onde?

Favela, segundo a Wikipedia, é sinônimo de bairro de lata; nada mais do que um assentamento urbano informal densamente povoado caracterizado por moradias precárias e miséria. É claro que a Wikipédia não é uma fonte confiável. 

A gente aprende isso na escola quando os professores nos alertam a não confiarmos as nossas pesquisas nessa plataforma já que são várias mãos que a editam e reeditam todos os dias e horas. Ainda assim, vejo que a sociedade entende bem o que é o nosso território.

Na comunidade do Córrego do Sargento, onde não tem parque, nem creche, nem escola, nem posto de saúde, nem campinho de futebol, nem associação dos moradores funcionando, a gente sabe bem o que é favela. Duvido chegar algum acadêmico para dizer o que é isso lá no Sítio, local de maior difícil acesso do nosso território, onde moram Jéssica, Júlia, Gabriel, Isabele e alguns outros adolescentes do Perifa. É que aqui a gente aprende na prática e se chegarmos na escola é que aprendemos na teórica. Se chegarmos na academia, aprendemos a chamar nossa terra de conjunto de conglomerados, comunidade periférica, dentre outros nomes mais chiques que no final, cabe tudo no conceito de favela. No final é tudo a mesma coisa, né não? Favela, favela e favela! Favela no Alto do Pascoal, Favela no Córrego do Sargento, Favela na Rua Rio Morno, Favela de Linha do Tiro inteira.

O Córrego do Sargento, por exemplo, tem a ausência de tudo o que deveria ser presença, afinal, se o Estado Democrático de Direito funciona de verdade, no país em que brancos dizem que “somos todos iguais” por que só a gente vê tanta desigualdade?

É 2023 e a água está jorrando na barreira. “A Defesa Civil mandou a gente sair daqui”, me disse Carol hoje cedo. E eu, afobada e bestando ao mesmo tempo, disse a mesma coisa que a Defesa: “é melhor sair logo, sai daí!” Carol é a mãe de Calebe, menino de 4 anos que está agoniado com a água que jorra. Ela saiu, claro, mas antes, Aninha sua vizinha me disse: “sair pra onde? A gente tem que achar um aluguel baratinho”. O auxílio-moradia dá pra isso? Não dá. Mesmo assim ela ainda vai se cadastrar.

E nesse sair pra onde, assim como no ano passado, liguei pra Dona Nêga, do Canal da Vovozinha, em Santo Amaro, pra Raquel que mora lá também. Pra Maria, da Comunidade do Côndor e pra Gabriel, meu pupilo do Córrego. A casa dele está bem na pontinha da barreira, mas a Defesa Civil já trocou a lona. No caso de Carol, até cesta básica ela ganhou…massa! 

Dona Nêga não me atendeu, estava ocupada tirando a água do canal que lhe estressa há 12 anos. Ano passado ela me disse isso também: “Sair pra onde?” E a pergunta à jornalista que se transforma em entrevistada nunca é respondida por mim. A única coisa que eu digo a mim mesma enquanto fico em um silêncio covarde é: 

Eu não sei! Eu não sei! EU NÃO SEI!

Escrito por:

Sargento Perifa

sargento.perifa@gmail.com

Os sargentinos, como gostam de ser chamados, são pessoas que possuem laços fortes de identidade entre si. Orgulhosos do lugar onde moram, sempre estão criando iniciativas para a melhoria de todos.